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sábado, 2 de janeiro de 2010

A INFORMAÇÃO DO ESTADO E A ECONOMIA.

No seu discurso de Ano Novo (2010), o Presidente da República apresentou como solução para a actual crise (quase explosiva) que se vive em Portugal, sendo ela principalmente de cariz económico, (1) o “aumento da competitividade nacional” e (2) um “maior apoio aos mais desfavorecidos”. Esta ordem de pensamento necessita de uma curta análise interpretativa do significado de ambas as prioridades.

No que diz respeito ao “aumento da competitividade nacional” convém estabelecer que a mesma é resultante da capacidade dos produtos nacionais têm de competir com os seus concorrentes internacionais. Neste jogo concorrencial, existem dois factores fundamentais: o preço relativamente aos produtos de massa ou “commodities” e a qualidade nos produtos de nicho ou “premiuns”. Assim, concorremos pelo custo de produção que nos permite vender a preços mais baixos do que os concorrentes ou concorremos pela qualidade dos produtos, sendo que esta qualidade se manifesta num mais elevado “valor” que os mesmos possam ter para os consumidores.

Vejamos como se poderá obter cada uma dessas vantagens competitivas.

O custo baixo de produção ou preço baixo de venda obtém-se por via de vários factores, entre outros: baixo custo da mão de obra (politica laboral); elevado índice de produtividade das empresas por via de excelentes processo de gestão e de automação(inovação empresarial) ; taxa cambial em baixa da moeda do país em que o produto é produzido ou taxa cambial em alta da moeda do país que importa o produto (politicas monetárias); baixos custos de externalidade (custos com o Estado relacionados com a burocracia e com os impostos); infra-estruturas de apoio à actividade económica (investimento público no âmbito da comunicação e da distribuição e na criação de centros tecnológicos); aquisição de matérias primas a preços competitivos por via de políticas comerciais internacionais (acordos inter-governamentais); e, excelentes competências individuais do mercado de trabalho (formação e educação da população trabalhadora).

A qualidade dos produtos, reflectida no “valor” dos produtos, obtém-se por via de vários factores, entre outros: inovação dos produtos obtida por via de novas funcionalidade, do design e da utilização de novos “inputs”; inovação dos processos produtivos obtida por via de novos processos e equipamentos produtivos, de novos processos de gestão organizacional e das TIC e de novos processos de marketing no âmbito da imagem/comunicação e distribuição;

Em género de conclusão, e olhando para cada um deste factores, facilmente chegaremos à conclusão que dificilmente conseguiremos ter qualquer vantagem competitiva em qualquer um deles. Na verdade, a nossa posição relativa em todos os factores relacionados com baixos custos de produção é muito inferior quando comparado com as economias do BASIC e outros do mesmo género e é das mais baixas relativamente à qualidade de produtos quando comparada com os nossos parceiros europeus e similares.

Porém, se tentarmos posicionar este assunto no campo político-económico, chegaremos rapidamente à conclusão que os factores acima enumerados são mais facilmente influenciados de forma positiva por sistemas neo-capitalistas do que por sistemas socialistas. Isto significará que a liberdade individual e de escolha, características intrínsecas dos mercados livres e abertos, se sobreporão aos direitos de igualdade e da responsabilidade comunitária. Este entendimento é crucial para se compreender a pertinência, ou falta dela, da segunda prioridade identificada pelo Senhor Presidente da República.

Pegando então no tema do “maior apoio aos mais desfavorecidos”, convirá começar por identificar quem serão os “mais desfavorecidos”. Neste grupo, poderemos incluir alguns dos mais afectados: desempregados de longa duração por força da sua falta de qualificações; jovens sem qualificações e jovens licenciados com imensas dificuldades na obtenção de colocação no mercado de trabalho; idosos com baixos recursos e meios de subsistência; imigrantes e pessoas com deficiências motoras e psíquicas com dificuldades de empregabilidade; e, crianças, jovens e idosos sem família de suporte.

Estes grupos de desfavorecidos apenas poderão ser ajudados por um Estado Social, que transfira recursos do bem comum gerados pela população activa/produtiva para suporte às necessidades dos mesmos, porque as empresas numa economia neo-capitalista ou de mercado não irão, com toda a certeza, assumir, de forma directa, o ónus com tais externalidades, a não ser que daí advenha alguma vantagem competitiva para elas próprias.

É aqui que começam os paradoxos entre as duas prioridades. Para fortalecer o tecido empresarial e criar condições para que se tornem competitivos, ter-se-ão de tomar medidas políticas de âmbito fiscal e laboral que apenas poderão ser contrárias aos interesses dos grupos desfavorecidos. Para apoiar de forma mais acentuada os grupos desfavorecidas ter-se-ão de tomar medidas políticas de âmbito laboral, fiscal e legal que irão contra os interesses das empresas.

Dentro dos limites definidos pelos pólos opostos, “Individualismo e Comunitarismo”, “liberdade e igualdade”, “liberalismo e socialismo”, é difícil, senão impossível, ser simultaneamente uma coisa e outra. Nesta dicotomia entre branco e preto não existe espaço para “tons de cinza” no que diz respeito aos maiores e mais pertinentes interesses de um e outro lado.

É neste contexto que as prioridades enumeradas pelo Presidente da República se tornam inviáveis, especialmente se a sua implementação for tentada em simultâneo. Para que a segunda prioridade, o maior apoio aos mais desfavorecidos, seja possível teremos de ter uma economia forte e um Estado com capacidade financeira para desenvolver acções de apoio aos mais desfavorecidos, o que significa que será necessário implementar a primeira prioridade em primeiro lugar. Para que a primeira prioridade, o aumento da competitividade nacional, seja uma realidade teremos de deixar a segunda para depois, para o médio ou mesmo longo prazo, na medida em que os resultados, especialmente face ao ponto de partida já de si tão deficitário, serão sempre de lento desenvolvimento.

Sendo assim, a quem compete definir prioridades? Ao Presidente da República ou ao Governo? E quem irá ter a coragem, política e social, para esclarecer este assunto a todos os Portugueses, bem como informar quais serão todas as implicações de uma qualquer prioridade para os diferentes agentes económicos e sociais? Quem irá, de uma vez por todas, dar as más notícias aos Portugueses? Ou iremos esperar pelo anunciado desfeche para que a notícia seja post mortem?