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sexta-feira, 30 de outubro de 2009

A RIQUEZA DAS FAMÍLIAS E A ECONOMIA.

Os dados estatísticos mostram que as famílias portuguesas estão a amealhar mais do que costumavam fazer nos últimos anos.

Quer isto dizer que estamos a atravessar a crise de forma confortável e que a população portuguesa está devidamente preparada para enfrentar os tempos ainda difíceis que restam antes da retoma económica? Não, necessariamente.

De facto, o capital bem como os activos financeiros líquidos detidos por particulares aumentaram no segundo trimestre deste ano, contrariando a tendência de mais de uma ano, coincidente com todo o despoletar, primeiramente, da crise financeira e, depois, da económica.

Por uma lado as pessoas estão a poupar mais. Por outro, tem-se assistido a uma ligeira mas continuada recuperação das bolsas. Contudo, muitos dos investidores bolsistas passaram para produtos bem mais seguros, como depósitos a prazo, os quais têm vindo a aumentar consideravelmente.

Mas quem são as pessoas que estão efectivamente a poupar mais? Quem aufere rendimentos diminutos, já insuficientes muitas vezes para suportar o custo de vida diário, não conseguirá por certo aforrar o quer que seja. Quem perdeu o seu rendimento por via do desemprego muito menos poderá ajudar neste exercício. Então quem sobra? Naturalmente que aquelas que continuam a laborar e a auferir os seus rendimentos e que mais ganham na pirâmide hierárquica do rendimento geral.

Efectivamente a classe média-alta, que conseguiu preservar os seus empregos ou negócios, terá capacidade para aforrar agora mais do que antes, por força da deflação existente ou por retracção no consumo, ou até mesmo no investimento.

Assim, o aumento de capital devidamente guardado em depósitos a prazo ou noutros produtos financeiros garantidos, parcial ou totalmente, ao invés de querer significar que estamos a ficar mais fortalecidos enquanto população para enfrentar a crise que ainda continua, significará por certo que a crise se agudizará ainda mais, devido principalmente à diminuição do investimento privado.

Em vez de investirem em propriedades imobiliárias ou consumirem mais bens de consumo, quem detém o capital está a guardá-lo, na expectativa da queda dos preços por força da deflação ou por medo de vir a perder os seus investimentos. A aversão ao risco cresce consideravelmente em tempos de crise. Não basta a comunicação de que os restantes países da Europa e os EUA estão a sair da crise e que existem sinais de retoma. É necessário sentir isso à nossa volta, o que não está a acontecer neste momento.

A continuada subida do desemprego, que ainda não atingiu os valores por muitos vaticinados, a falta de projectos nacionais estruturantes e suficientemente abrangentes que promovam a recuperação económica e o emprego, a inexistência de políticas de apoio à iniciativa privada e individual, e outras situações contrárias à satisfação social fazem com que os cidadãos que possuem activos financeiros os deixem estar muito bem guardados nos cofres dos bancos ou noutras instituições fidedignas, se ainda existir tal segurança.

Desta forma, sem investimento e sem consumo forte, naturalmente que os cofres dos bancos cheios de dinheiro em nada ajudarão à criação de riqueza e à saída da crise. 

PARQUES DE ESTACIONAMENTO E MULTAS POR ESTACIONAMENTO

A razão inicial que leva as autarquias a criar áreas de estacionamento pago é rapidamente esquecida em favor de outra bem mais importante, a das receitas.

As autarquias costumam criar zonas pagas de parqueamento automóvel de forma a fazer com que as pessoas se sintam desincentivadas a levar os seus carros para as zonas centrais das cidades e a deixá-los lá por muito tempo, fazendo assim uma ocupação plena dos poucos espaços existentes para se poder parquear viaturas automóveis.

Efectivamente, é a falta de espaço público livre para se estacionar as viaturas nos centros das cidades e vilas que cria a necessidade de se limitar o tempo de estacionamento. Este princípio parece justificar a criação de limite de tempo de estacionamento, para que todos possam usufruir dos limitados espaços físicos existentes, bem como de um custo para o fazer, de maneira a criar uma barreira económica à utilização exagerada do espaço público.

Geralmente estas situações acontecem porque as cidades não foram planeadas para receber sequer automóveis, quanto mais nas quantidades que hoje em dia afluem aos centros urbanos.

A isto chamam os economistas “falha de mercado”. Assim, espera-se que o próprio mercado, do lado da oferta, dê resposta às necessidades, isto é à procura, criando espaços onde as pessoas possam estacionar as suas viaturas. Contudo, se as autarquias continuarem a disponibilizar espaços de estacionamento a custo zero para os utentes, os privados que o fizeram terão enorme dificuldade em obter utilizadores e, consequentemente, retorno par aos seus investimentos. Porém, numa situação de espaços públicos livres e gratuítos em reduzida quantidade e simultaneamente de oferta privada em grande quantidade pode-se perder a igualdade de oportunidade entre os que conseguem estacionar gratuitamente e os que se vêem obrigados a pagar para o mesmo fim.

A grande procura de estacionamento nos centros urbanos tornou-se numa enorme oportunidade de negócio. De tal forma que as autarquias já não estão interessadas nem em oferecer estacionamento gratuíto nem em limitar o tempo de estacionamento, de forma a que todos os utilizadores tenham a igualdade de oportunidade de obter um espaço livre para estacionar, mas estão antes interessadas em obter receitas para elas próprias.

Desta forma, o utilização de parquímetros generalizou-se nas localidades, grandes e pequenas, sendo que as ruas passaram a ser espaços de criação de receitas para as autarquias em vez de serem espaços para circulação e estacionamento.

Por outro lado, e devido ao enorme custo do espaço urbano, em geral altamente inflacionado pela especulação imobiliária, construir parques de estacionamento não é uma das opções mais lucrativas para a iniciativa privada. Esta realidade leva a que as autarquias tenham interesse redobrado na gestão dos espaços livres e destinados aos estacionamentos.

Uma “falha de mercado” torna-se, por via da tentativa da sua própria solução, numa “falha do regulador” que acaba por criar mais um imposto sobre os cidadãos utilizadores dos estacionamentos urbanos. A falta de transportes públicos adequados que permitam a movimentação dos cidadãos dentro das zonas urbanas com facilidade, na maioria das vezes inexistentes por falta de rentabilidade de tal serviço, leva a que os utilizadores tenham de se fazer transportar em viaturas próprias, enchendo cidades e vilas. Estupidamente, continuamos a suportar tais esquemas em nome da regalia de levar as nossas viaturas para os centros urbanos.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

A ECONOMIA NA IGUALDADE DE GÉNERO

Quem contribui mais para a economia: os homens ou as mulheres?  

A resposta a esta pergunta não pode ser vista apenas sob um dos potenciais pontos de vista, pecando por se tornar redutor. Vejamos uma das possíveis perspectivas que se podem ter sobre o assunto.

"O gap salarial entre homens e mulheres ronda os 10% nas profissões de nível mais baixo, mas quando se sobe na escala vai piorando. Nos cargos de topo, a diferença ronda uma média de 30% a favor dos homens". Esta constatação poderá indicar que tal facto contribuirá para uma maior competitividade da nossa economia?

Aparentemente, sim. De facto, salvo raras excepções onde a força e a resistência físicas se demonstram determinantes, as mulheres são tão produtivas quanto os homens, chegando mesmo a atingir mais elevados níveis de produtividade em actividades muito repetitivas e de longa duração. O mesmo se passa em actividade de índole criativa e intelectual.

Se esta visão é favorável à economia, por via do aumento de competitividade, então onde poderá estar a desvantagem? Claramente, e muito raramente definida como o efeito último, a desvantagem está na distribuição do valor gerado e no efeito que a mesma tem na economia. Populações com menores rendimentos consomem menos e têm menores hipóteses de aforrar.

Contudo, esta visão do aumento de competitividade por via da utilização de recursos menos dispendiosos, mão de obra feminina, poderá ser rapidamente anulada se os outros países fizerem o mesmo, o que de resto já acontece. A componente feminina do total da mão de obra dos países nas economias ocidentais tem subido nas últimas décadas, não só em quantidade como em qualidade e competências. Daí, e por via da globalização dos métodos de gestão, o expediente poderá não funcionar. Então o que resta fazer?

Uma das primeiras opções, não sendo possível equiparar os níveis retributivos das mulheres ao dos homens, é precisamente fazer o contrário. Assim, existirá uma perda generalizada do poder de compra das populações, o que volta a nivelar todos os países, mas pelo menor denominador comum.

Quem irá perder com este esquema de redução do custo da mão de obra? A classe média, naturalmente, como de resto se tem vindo a verificar nos últimos tempos no ocidente.

Assim, a questão “quem contribui mais para a economia, os homens ou as mulheres?”  parece perder todo o sentido, porque, estupidamente estamos a ser usados e acabaremos por perder todos em conjunto.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

A CRISE NÃO É PARA TODOS

Estamos a assistir ao regresso dos prémios chorudos no mundo financeiro. 

O regresso dos prémios milionários aos gestores de topo das grandes empresas financeiras pode colocar algumas questões aos cidadãos contribuintes.

Depois da crise financeira provocada essencialmente pelos produtos tóxicos (sub-prime e outros de elevado risco) e dos tremendos prejuízos a eles associados que levaram muitas instituições financeiras à quase ou mesmo falência, sendo que algumas foram salvas pela intervenção dos Estados, ou por outras palavras, pelos contribuintes, o mundo financeiro voltou aos lucros, nalguns casos ainda mais elevados do que no melhor ano antes da crise, 2007.

Com a desculpa da crise financeira, os bancos viram as taxas de referência baixar em todo o mundo para valores mínimos. Com base neste contexto, os bancos aproveitaram para fazer subir as suas margens (spreads) aos seus clientes, o que lhes trouxe margens de lucro acrescidas. Da mesma forma, e por força do controlo necessário para evitar créditos mal parados, muitas operações passaram a estar seguras pelos próprios Estados.

Entre nós, isso aconteceu com o programa PME-Investe, que permitiu a muitas empresas com dívidas dispersas à banca substituírem as mesmas por uma única e consolidada conta, sendo esta garantida parcialmente e objecto de bonificação pelo Estado.

As empresas poderão ter ganho alguma coisa com a ligeira redução da taxa de juros aplicada, sendo que nem sempre assim aconteceu, mas os grandes “ganhadores” foram os bancos que viram os seus spreads aumentar por força das condições do programa e viram o seu risco reduzir-se para metade ou, também em alguns casos devido a subtis engenharias, para quase nada.

O facto é que muitos apoios dados pelos Estados à economia, directamente às empresas ou aos consumidores, acabaram indirectamente nos cofres das entidade financeiras, juntando-se ainda às ajudas (donativos) que os mesmos Estados tinham dado directamente às referidas entidades.

Não é de admirar que os lucros da grande maioria de entidades financeiras tenha de repente atingido valores nunca pensados, até mesmo acima do que de melhor já tinha acontecido no passado.

E nada melhor do que retribuir os gestores de topo dessas mesmas entidades com prémios, indexados aos novos êxitos, como recompensa pelo excelente trabalho desenvolvido na recuperação dos lucros perdidos. Fica sempre a questão sobre os prejuízos causados pela má gestão de tais gestores e que apenas foram estupidamente pagos pelos contribuintes.

Claro que sob a ameaça de podermos perder tudo, qualquer um de nós aceita contribuir para salvar a situação de quase falência do sistema financeiro. Mas porque não nos é agora devolvida a ajuda que demos, enquanto contribuintes, para salvar as entidades financeiras?

Parece que acabamos por pagar mais um grande “imposto” para benefício de apenas uns poucos. Estupidamente, fomos mais uma vez comidos por “parvos”.

domingo, 11 de outubro de 2009

A RELAÇÃO ENTRE A EDUCAÇÃO, A CRIMINALIDADE E A ECONOMIA.

Estaremos a caminho da “barbarização” da sociedade?

A falta das competências que permitam adquirir formas de ganhar a vida pelo trabalho leva muitas pessoas sem qualificações e competências a viverem de forma equivalente ao estado primitivo do homem recolector, só que actualmente a colheita é urbana e sobre os bens de outrem.

Um recente estudo da Northeastern University (EUA), utilizando os censos e outras informações do governo americano, analisou as experiências nos empregos, nos locais de trabalho, na paternidade e no crime dos jovens que desistiram da escola. Os resultados apontam para a existência de uma relação directa entre a desistência na escola secundária e a criminalidade.

Estes dados, apesar de se referirem aos EUA, serão por ventura coincidentes com os restantes países considerados desenvolvidos, onde se inclui o nosso.

Sem que surja como uma surpresa para muitos, este estudo, como outros feitos anteriormente, vem efectivamente retirar qualquer dúvida sobre a existência de uma forte exclusão ao nível económico dos menos literados e qualificados que se converte em exclusão social e em criminalidade.

Algumas décadas atrás, os jovens que saiam da escola no final do ensino secundário, ou até mesmo antes, encontravam facilmente emprego nas indústrias transformadoras e na construção civil, como fuga à agricultura, auferindo salários que lhes permitiam ter um nível de vida aceitável e despreocupado.

A situação mudou nas últimas décadas. As indústrias transformadoras com mão de obra muito intensiva têm vindo a deslocar-se para outras regiões com mão de obra mais barata (América do Sul, Europa Central e Ásia). Os postos de trabalho que vão restando, como os serviços, necessitam de mais competências e qualificações, sendo que também não são em tão grande número que consigam absorver toda a mão de obra desqualificada que foi crescendo com a deslocalização, primeiro das grandes indústrias e, depois das outras utilizadoras ainda de alguma mão de obra de vulto.

Esta situação tem contribuído para que muitos jovens, principalmente do sexo masculino, que também deixam a escola mais precocemente, tenham de sobreviver de trabalhos precários e temporários, dificilmente atingindo situações de emprego de longa duração. Mas outros ainda há que nem trabalho conseguem obter, pelo que se dedicam a actividades ilícitas e à criminalidade, desde idades muito baixas, inseridos em ambientes familiares precários e inseguros.

É normal que quem não consiga ganhar o seu sustento tente colher o mesmo de outra forma. Os nossos antepassados longínquos sobreviveram durante milhões de anos colhendo o que a natureza lhes proporcionava. Nos dias de hoje a natureza é urbana e os bens possuem legítimos donos. Assim, num processo de “barbarização” das sociedades ocidentais, assiste-se ao aumento da criminalidade como consequência da falha dos sistemas económico e social que não criam formas de providenciar trabalho nem fornecem qualificações e habilitações que sustentem o desenvolvimento económico para toda a população.

Populações empobrecidas e desqualificadas fornecem mão de obra mais barata para actividades primárias. Populações altamente qualificadas e ricas não se sujeitam à precaridade e à insegurança. O constante afastamento destes dois grupos pode ter graves consequências nas sociedades futuras. Estupidamente, as visões unilaterais deste problema poderão obstruir a tomada de decisões adequadas, contribuindo potencialmente para criar verdadeiras rupturas nas formas económica e social que conhecemos hoje.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

A SUBIDA DA BOLSA EM TEMPO DE RECESSÃO OU ESTAGNAÇÃO

Assim se enganam os incautos.

Nos últimos meses temos vindo a assistir a uma subida consistente em muitas dos mercados de capitais (bolsas) mundiais, criando-se um ambiente de euforia à volta dos lucros criados e dos máximos anuais atingidos, fazendo lembrar outros tempos de elevado crescimento nos primeiros sete anos do século.

Desde o Nobel da Economia Joseph Stigltz até ao investidor e bilionário George Soros, muitos especialistas alertam para os perigos deste repentino crescimento do valor de muitas acções em bolsa.

As empresas ainda não recuperaram, nem de perto nem de longe, da crise económica que se abateu sobre o mercado depois da crise financeira mundial criada pelo fenómeno do sub-prime nos EUA.

Inicialmente, e logo a seguir ao inicio da crise, o preço do petróleo subiu em flecha para valores nunca vistos antes, perto dos 150 USD por barril, possibilitando enormes lucros aos produtores e a muitos especuladores, mas provocando uma forte descida nos mercados de capitais e financeiros, com uma forte desvalorização do dollar americano.

Com a descida do preço do petróleo, os mercados de capitais recuperaram alguma confiança que se veio a converter num crescimento contínuo no valor das acções cotadas em bolsa à medida em que os preços do petróleo se mantinham estáveis.

Esta aparente, falta ainda provar que é sustentada, recuperação da economia tem dado sinais ao mercado que volta a ser seguro investir na bolsa.

O perigo que se coloca com este estado de espírito aparentemente demasiado “optimista”, não fundamentado numa recuperação sustentada da economia em geral, especialmente ao nível da produção e criação de valor acompanhados por aumento de consumo, é que pode induzir muitos investidores mais incautos a direccionarem os seus capitais para os mercados de capitais, na expectativa de virem a obter mais valias de forma fácil, quando não é seguro que este crescimento das bolsas não seja fruto de possíveis manobras de falso crescimento feitas pelos grandes “manobradores” de capitais que sofreram pesados prejuízos com a queda anterior das bolsas.

Aquando da última queda do valor das acções cotadas, muitas empresas viram o seu valor bolsista descer muito abaixo do seu valor real. Este facto não teve um impacte directo imediato nas mesmas, mas com a recessão económica que sucedeu à crise financeira muitas delas viram-se na situação de  acumular prejuízos provocados pelo decréscimo de actividade e acabaram por fazer equivaler em baixo o seu valor real com o seu valor bolsista.

A actual tendência para o rápido crescimento do seu valor bolsista, não estando suportado pelo seu crescimento de actividade, pode criar uma “bolha” que, mais cedo ou mais tarde (como sempre), vai ter de despejar.

É neste processo de especulação que os incautos são recorrentemente apanhados. A não ser que a economia possa dar mostras de crescimento sustentado, por via da criação de valor através do aumento de produção e da acumulação de riqueza, o crescimento do valor bolsista é enganador. A confiança necessita de ser recuperada, mas não estupidamente através de enganos e falácias especulativas. Os cuidados agora são mais do que necessários.

POUPANÇAS E CRESCIMENTO ECONÓMICO

O desprezo pelas poupanças particulares afecta a economia de forma negativa.

A crise continua a ter impactes negativos na sociedade. A perda de valor das acções das empresas cotadas em bolsa tem efeitos na economia que vão para além dos prejuízos que tais desvalorizações possam causar directamente aos investidores.

Os dados mostram que o património bolsista dos particulares em 1998 equivalia a 172% do Produto Interno Bruto (PIB), tendo baixado para 133% em 2007 e para 124,6% em 2009.

Esta última perda de valor no património particular nacional equivale a cerca de dezassete mil milhões de euros, o que daria para financiar por completo as duas maiores obras nacionais, o novo aeroporto e o TGV.

Contudo, para além dessa perda tangível de valor, que apenas será recuperável a longo prazo com a recuperação da confiança e da valorização dos mercados bolsistas, existem outros impactes que nos podem afectar a todos em geral.

As valorizações bolsistas são na grande maioria dos casos aproveitadas pelos investidores para obterem suficiente capital para investir muitas vezes em actividades directa ou indirectamente produtivas, que contribuem positivamente para o PIB. As perdas verificadas, não só na redução ou eliminação dos rendimentos mas também do próprio capital investido no mercado bolsista contribui para a eliminação da capacidade de investimento e para a criação de um ambiente adverso ao risco associado ao investimento.

Por outro lado, os investidores reagem ao risco bolsita desviando as suas poupanças dos mercados de capitais para outros produtos financeiros sem risco, como Títulos do Tesouro ou depósitos a prazo, os quais oferecem rentabilidades muito inferiores, por vezes abaixo da taxa de inflação, o que acrescenta pouco valor a quem possui poupanças.

Mas as crises nos mercados de capitais afectam ainda directa ou indirectamente as taxas de juros centrais e as cotações monetárias, o que pode ter outros impactes nefastos na economia.

As poupanças são, como vimos, uma forma de retenção de riqueza, quando devidamente salvaguardadas, mas também uma forma de financiamento e apoio ao investimento produtivo, quando praticado dentro das regras de sã gestão e coexistência no mercado.

A especulação bolsita, traduzida em crescimentos desmedidos do valor das acções, altamente inflacionadas e em pouco suportadas pela actividade produtiva em si, tem o risco de criar falsas “bolhas” de riqueza que mais cedo ou mais tarde se convertem num esvaziamento desse mesmo valor com prejuízos elevados para muitos aforradores.

Estes ciclos de crescimento bolsistas (bull markets) têm geralmente impacte positivo no crescimento económico das economias nacionais, regionais ou mesmo global. Mas, como poderemos facilmente deduzir, e temos a prova recente, não são sustentáveis a longo prazo, obrigando a reajustamentos na economia com impactes negativos nos PIBs dos países.

A destruição de poupanças (riqueza acumulada resultante de esforço dispendido) é um dano irremediável a qualquer economia. Políticas de incentivo à assunção de risco desmedido com o objectivo de cativar economias particulares para criar falsos crescimentos da economia a curto prazo, parecem-nos estupidamente inconscientes e danosas a longo prazo, para todos em geral.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

O PODER DOS “MEDIA”

Os “media” podem distorcer o normal funcionamento da economia. Devemos estar atentos à sua influência.

Conhecemos os “media” como o “quarto poder”. Murdock disse uma vez que, se quisesse,  podia eleger ou fazer cair governos. De facto, os media são utilizados desde há muito tempo por governos e oposições (quando têm essa liberdade) para influenciar pessoas. A expressão “está escrito” é ainda utilizada por muitos como sinónimo da veracidade de algo.

A utilização dos “media” na divulgação da gripe A fez disparar a procura de vacinas para a epidemia. A não divulgação dos media do número de mortes diárias causados pelo tabaco e pelas drogas, com constantes actualizações, faz com que se continue a assistir ao aumento do número de jovens que se iniciam no consumo de tais produtos.

A informação sobre a gripe aviária causou enormes prejuízos aos produtores e distribuidores de carne de galinha, sem que nem sequer se tivesse identificado uma única situação de contágio no nosso país. O mesmo tem acontecido com outros produtos, marcas de produtos ou mesmo serviços. A divulgação de alguma práticas menos adequadas na indústria da restauração em segmentos específicos como a comida oriental tem reduzido imenso o número de clientes nesse tipo de restaurantes, levando ao encerramento de alguns.

Não é por acaso que as grandes empresas, especialmente as cotadas em bolsa, possuem departamentos de informação que trabalham na divulgação dos resultados económico/financeiros bem como na promoção dos seus produtos de forma não publicitária, ou ainda na resolução de problemas que tenham surgido e sido alvo do interesse dos “media”. Da mesma forma, a CMVM (entidade reguladora dos mercados de capital, vulgo bolsas, em Portugal) e outras entidades congéneres por todo o mundo fiscalizam a informação, ou desinformação, que as empresas cotadas disponibilizam para o mercado em geral, aplicando elevadíssimas coimas aquelas que por via da desinformação influenciam ou são susceptíveis de influenciar o valor das suas acções em bolsa.

O poder da informação é assim enorme.

Um comentário favorável acerca de um produto de consumo, de um estabelecimento, de um serviço, pode fazer aumentar tremendamente o número de clientes ou consumidores. Um comentário desfavorável tem, normalmente, ainda efeitos mais amplos.

Se por um lado, as empresas necessitam de estar atentas aos conteúdos acerca das suas actividades que possam merecer a atenção dos “media”, os consumidores deverão ainda ter mais cuidado, porque não é inédito que a informação que é fornecida ao mercado tenha sido manipulada de forma a obter um determinado resultado.

Foi feito há alguns anos atrás um estudo em Portugal em que foram colocadas a teste cego três marcas de cerveja, todas elas conhecidas do grande público. Os resultados foram no mínimo surpreendentes. A líder de mercado foi na maioria dos testes classificada como a pior de todas, em paladar e demais parâmetros analisados. Contudo, quando as mesmas cervejas foram fornecidas com as devidas identificações, exactamente às mesmas pessoas que participaram no estudo, a líder já devidamente identificada pelo seu rótulo e marca, foi considerada pela esmagadora maioria dos participantes como a melhor.

A força da marca tinha desempenhado o seu papel. Os “media” também contribuem, voluntária ou involuntariamente, para esse fim.

Como consumidores temos de ter o cuidado de analisar se estamos ou não a ser levados a comprar determinados produtos ou marcas por impulso, apenas porque nos foi induzido essa mesma vontade de forma inconsciente mas efectiva.

Provavelmente, a maioria dos consumidores comprará, estupidamente, muitos produtos sem saber bem o porquê do seu próprio comportamento.