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sexta-feira, 25 de setembro de 2009

COMPETÊNCIAS vs QUALIFICAÇÕES

A riqueza de um país é o somatório de todo o valor criado ou acrescentado com que cada individuo possa contribuir para a sociedade.

Semear uma semente e depois colher muito mais sementes ou frutos da planta que nasceu, que serão transaccionados por outros produtos ou por uma qualquer outra moeda de troca, será a forma mais simples e primitiva de criar valor, ou numa linguagem mais corrente, de acrescentar valor.

Criar uma ferramenta que pode semear muitas sementes ou colher muitos frutos de forma mais eficiente é outra forma de criar valor, por ventura mais vantajosa do que a primeira porque permite que a sua repetida utilização  contribua para a repetição da criação de valor.

Criar uma obra de arte é também uma forma de criar valor, ainda que com base na intangibilidade da mesma. Neste caso, o valor acrescentado poderá ser muito maior do que nos dois primeiros casos.

Desenvolver um novo conhecimento, científico ou não, que possa ser utilizado por outros indivíduos de maneira a criarem mais valor de forma repetida é ainda, quiçá, o processo com maior potencial para criar valor e riqueza colectiva.

Para que os indivíduos possam semear sementes, criar máquinas ou obras de arte e desenvolver novos conhecimentos, deverão possuir as “competências” devidas e necessárias.

Competência, numa definição muito livre, é o somatório do saber ou ter conhecimento sobre algo, mais o saber fazer algo aplicando esse conhecimento e, ainda, ter a atitude certa para o fazer da forma correcta.

É o desenvolvimento das competências que levam o homem e as sociedade a evoluir e a crescer. Sem aumento de competências será difícil que qualquer sociedade consiga fazer algo de diferente daquilo que já faz.

No processo de aprendizagem para se obter competências, utiliza-se a progressiva qualificação das pessoas como forma de se aquilatar da sua, supostamente, aquisição de competências. Assim, ter uma qualificação é na maioria das situações na sociedade sinónimo de ter também a correspondente competência. A licenciatura de um jurista deverá significar que conhecerá as leis e deverá ter a competência para as aplicar em defesa ou acusação de uma qualquer situação prevista nas mesmas leis. A obtenção da carta de condução deverá significar a existência da competência para conduzir um determinado tipo de veículo.

Porém, sabemos que nem sempre isto é verdade. Qualificação não significa necessariamente competência.

Este é um erro que poderá ser fatal para a economia. A escolaridade obrigatória até certos níveis de qualificação, como o 12º ano, não faz dos nossos jovens pessoas com mais competências. A atribuição de diplomas de equivalência a níveis de escolaridade por via da experiência não dá às pessoas competências que possam ser utilizadas para produzir mais valor.

O título, tal como o hábito para o monge, não faz de ninguém médico, arquitecto, engenheiro ou gestor.

A economia só progride se as pessoas, independentemente dos seus títulos e qualificações académicas, tiverem vastas competências que possibilitem a criação de elevado valor, por via da criação de novas soluções e de novos conhecimentos, esses sim potenciadores de desenvolvimento económico.

O valor acrescentado é tanto maior quanto maior for a dificuldade em produzir algo, quer seja produto, serviço ou combinação de ambos. E a maior dificuldade exige mais elevadas competências. Sem essas, nunca conseguiremos criar riqueza que possa ser distribuída e utilizada na criação de uma economia forte.

Infelizmente, e pior ainda, estupidamente, as políticas de qualificação nem sempre servem para o desenvolvimento e criação de competências. Por certo, não nos servirá de muito sermos todos doutores e engenheiros e não termos as competências necessárias nem para fazer nem para criar nada.

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

ENDIVIDAMENTO POR RAZÕES ERRADAS

Governar um país é como governar uma empresa ou mesmo a nossa casa.

Todos sabemos que apenas conseguimos gastar o que ganhamos, isto é, o que gastamos não pode ser superior ao que ganhamos, a não ser que estejamos a contrair endividamento para cobrir esse excesso nos gastos.

O endividamento, quando utilizado para resolver questões de deficit causado pela diferença entre proveitos e custos, tem quase sempre uma forte implicação no futuro de quem o faz.

Se uma empresa, uma família ou mesmo um país utilizarem o endividamento como solução para eliminarem o deficit causado por uma situação corrente ou de contexto, mas que é resultante de uma situação sistémica, como por exemplo numa família, a perda de um emprego (corrente ou de contexto) mas por falta de competências (sistémica), o mais certo é que esse endividamento irá permanecer a longo prazo, porque a recuperação do emprego se adivinha difícil ou mesmo impossível. Neste caso, o melhor seria cortar imediatamente os custos para níveis suportáveis pelas receitas, o que nem sempre é viável de imediato.

O mesmo se passa com a governação dos países.

Neste actual contexto de crise global, em que temos assistido à redução do consumo da população e do investimento em geral, os governos têm vindo a sofrer fortes cortes nas suas receitas, devido à diminuição dos montantes cobrados pelos impostos sobre o consumo e o investimento.

Contudo, nos Estados com fortes políticas de apoio social às suas populações, os gastos com esses apoios e pelas mesmas razões contextuais da crise global, têm aumentado significativamente.

Temos assim que, por um lado os Estados estão a recolher menos impostos (redução da receita) e por outro estão a incrementar o apoio social (aumento da despesa), o que os obriga a utilizarem a ferramenta do endividamento, na forma de obrigações (títulos) e de outros veículos financeiros. Este endividamento é obtido no pressuposto de que será honrado na devida altura no futuro.

Se a situação que levou ao endividamento for de contexto e de curto prazo, o pagamento da dívida torna-se viável, na medida em que a recuperação da economia permitirá o rápido incremento das receitas (por via dos impostos).

Porém, quando um país utiliza o expediente do endividamento para resolver o problema de contexto, mas tem por detrás desse um outro que é sistémico, ou seja a falta de produtividade e competitividade que reduz a criação de valor e acumulação de riqueza, o pagamento desse mesmo endividamento torna-se doloroso e assume o carácter de um problema de longo prazo, possivelmente sem fácil solução à vista.

Quando a solução não vem do lado da receita, só poderá ser encontrada no lado da despesa, significando que o pagamento de tais dívidas irá ser feito pelo corte no consumo e pelo pagamento de elevados níveis de impostos das gerações vindouras, que terão de pagar a herança deixada pelo desequilíbrio causado no presente.

Assiste-se neste momento a este expediente por parte de muitos governos, que inequivocamente trará tremendas consequências num futuro próximo para as populações desses países, e que se prolongarão num futuro longínquo.

Muitas vezes, estupidamente por pura falta de visão ou excesso de egoísmo, pensamos apenas no presente e esquecemo-nos do futuro.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

RATINGS DOS PAÍSES

Como o endividamento público nos afecta .

Sabemos que o Estado não produz valor, pelo que tudo o que faz, fá-lo com recursos que têm a sua origem na valor que a população cria e que lhe é retirado na forma de impostos.

Infelizmente as despesas públicas, completamente suportadas pelos impostos que pagamos, ainda nos afectam de outras formas que não essa. Uma das formas em que nos afecta é através dos ratings do país para efeitos de financiamento externo.

Existem várias agências, supostamente independentes, que classificam os países de acordo com uma tabela. É frequente ouvirmos que um pais tem o rating de “triplo A” (AAA) ou de apenas B ou outro qualquer, não sendo a escala importante para o raciocínio que aqui pretendo deixar. Essa classificação é determinada em função de vários factores económicos e financeiros. As finanças do Estado, mais ou menos deficitárias, têm influência para o nível de classificação que se possa obter. Assim, Estados com economias fracas e com graves problemas de endividamento público não passam de ratings de baixo nível.

E como é que isso nos afecta? Nos juros do dinheiro que os bancos nacionais têm de pagar quando se financiam externamente. Quanto mais baixo o rating mais elevado o juro. Desta forma, quando as empresas ou os cidadãos se financiam juntos dos bancos, porque o dinheiro já vem com custos acrescidos para estes, acabam por ter de pagar mais pelos empréstimos que contraem. Assim, os custos, com a habitação e com o consumo que é financiado para a população em geral e com o investimento para as empresas, ficam mais elevados, retirando capacidade de compra e de investimento aos interessados.

A má governação pode-nos afectar economicamente de muitas formas, sendo que esta aqui analisada é das pouco mencionada por ser uma das menos sentidas de forma directa, como consequência da ineficácia dos governos e da própria incapacidade produtiva do país.

Os bancos também não se preocupam em esclarecer os seus clientes, por várias razões, sendo uma delas que quando os ratings do país melhoram e baixam os juros, deixando mais margem entre o preço de compra e de venda do dinheiro, os mesmos aproveitam para reter esse lucro para si  próprios. O inverso já não acontece, como naturalmente se compreenderá.

Estupidamente, esta como outras verdades, passam-nos ao lado.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

A FUNÇÃO SOCIAL DAS EMPRESAS

Quando a ganância das partes destrói o que cria valor.

Muito antes de se falar na responsabilidade social das empresas, políticos e académicos de várias disciplinas falavam já da função social das empresas.

Se as empresas existem como forma de providenciar retorno económico a quem investe, a verdade é que a sua abrangência económica não se fica por aí. As empresas providenciam também condições económicas a quem nelas trabalha em particular e à sociedade em geral, por via do valor criado e distribuído, em última análise através dos impostos e da forma como os mesmos são distribuidos.

Na realidade, e cingindo-nos apenas ao aspecto económico desta função social, porque as outras, juntamente com a económica, fazem parte de um pacote complexo e amplo a que se convencionou chamar de Responsabilidade Social das Organizações, pressupõe-se que as empresas distribuam riqueza a três níveis: aos accionistas ou investidores, por via de retorno sobre os investimentos efectuados; aos trabalhadores, através das compensações monetárias e outras regalias sociais que lhes são dadas em troca do trabalho; à sociedade, através dos impostos sobre os rendimentos e outros que são incorporados nos rendimentos que o Estado aufere e aplica na sociedade.

Enquanto estes interesses forem satisfeitos, na devida medida e proporção da sua importância e da sua participação, as empresas poderão e deverão sobreviver a médio e longo prazo. O problema põe-se quando uma das partes interessadas pretende obter a esmagadora maioria do valor criado pelas empresas, sobrepondo-se aos interesses das outras partes.

Quando os accionistas das empresas pretendem reter para si quase todos os resultados das empresas, de resto como se tem vindo a poder observar durante as últimas décadas com o fenómeno da globalização e o consequente comportamento dos mercados accionistas e afins, as outras partes criam defesas, nem sempre eficazes, para contrariar essa tendência. Infelizmente, a história recente mostra-nos que muitos casos de desmesurada ambição e ganância da parte dos accionistas levou a que as respectivas empresas entrassem em colapso económico e financeiro. Esta será a crítica mais comum ao sistema capitalista, tanto por quem a ele se opõe como até por alguns adeptos do mesmo.

Por outro lado temos que por vezes os trabalhadores, à semelhança de alguns accionistas, também vêem as empresas como um simples veículo para obterem dinheiro, não considerando que esse mesmo dinheiro tem de vir do resultado da criação de valor. Compensações exageradamente ambiciosas, em troca de participações demasiadamente reduzidas na criação de valor levam consequentemente as empresas ao esvaziamento económico e financeiro. Esta realidade tem tido mais expressão ultimamente nas hierarquias de topo mas, contudo, as bases das estruturas hierárquicas das empresas compostas pelos operários ou outros trabalhadores menos qualificados e com menores compensações não estarão isentas de críticas. Qualquer que seja a função ou a hierarquia dentro de uma empresa que não produza no final do dia o suficiente para pagar os seus custos, directos e indirectos, e ainda deixar uma margem adequada para outros custos, impostos e lucro, será com toda a certeza inconveniente para a saúde da mesma empresa. Infelizmente, esta realidade, pelas mais diversas razões e culpas, não é devidamente entendida pela esmagadora maioria das pessoas.

Finalmente, o Estado, também como parte interessada na função social de base económica das empresas, nem sempre cumpre com a sua parte da melhor forma. A asfixia abusiva imposta às empresas por via de impostos e taxas sobre os mais diversos aspectos da sua actividade, não só sobre os lucros finais mas criando custos adicionais às empresas por via de obrigações sobre os trabalhadores, o ambiente, a condições de trabalho, a movimentação e circulação, as transacções comerciais, as instalações e segurança e outros factores de custo, deixa as empresas sem margem de manobra para poderem produzir produtos e serviços a custos que sejam competitivos para o mercado. O Estado, muitas vezes apenas vê as empresas como uma fonte de receita e não como veículos criadores de valor para a sociedade, ignorando que para que as mesmas funcionem e sejam viáveis necessitam de condições estruturais e de suporte que permita a criação de excedentes de valor, que serão distribuídos pelas diferentes partes interessadas ou reinvestidos em novas oportunidades de criação de valor.

Assiste-se neste momento a uma luta empertigada entre estas três partes, interessadas na função económica das empresas, com abusos constantes de qualquer uma delas. Quando se pretende retirar de dentro de algo mais do que esse mesmo algo contém, o mais certo é que o referido algo se quebre. As empresas, infelizmente devido a estes factores endógenos e a outros exógenos, como o enfraquecimento dos mercados o que também é uma consequência da condição criada, não conseguirão sobreviver muito tempo e deixarão de existir. No dia em que os investidores deixarem de obter retorno para os seus investimentos que compense o risco que assumem ao aplicar o seu capital num ambiente de incerteza como se vive presentemente, as empresas deixarão de nascer e a sua função cessará. O que será então das outras partes interessadas? Estupidamente, tal como os vírus, quando o hospedeiro morre, morrem também. Como pode esta verdade ser ignorada? 

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

ONDE ANDA O CAPITAL?

O risco dos depósitos nunca foi tão grande

Dizem as estatísticas que nunca se assistiu a um tão crescente número de aforradores  a colocarem as suas economias em depósitos a prazo nos bancos comerciais., sendo que o total de capital em tais tipos de depósitos atinge valores record para os últimos anos.

Por um lado, parece que a descida da rentabilidade dos certificados de aforro está a fazer deslocar as poupanças mais conservadoras do fundos do Estado para os depósitos a prazo das entidades bancárias. Por outro lado, a população em geral está mais contida no que diz respeito ao consumo e ao investimento, o que leva a que mais gente tenha excedentes monetários que são guardados para posteriores utilizações.

Mas se o dinheiro está nos bancos, porque não é este enviado para a economia?

A verdade é que os bancos estão a reter esses capitais, depositando-os nos bancos centrais de onde apenas obtêm juros mínimos em vez de os utilizar para financiar as actividade económicas, isto é, as empresas e até mesmo o investimento particular. Isto, porque de repente, os bancos ficaram adversos ao risco.

Os exageros do passado levaram muitos bancos a criar grandes carteiras de incobráveis. Muitos investidores fizeram o que todos sabemos que é demasiado arriscado de se fazer: contraíram financiamentos com a banca para investir nos mercados accionistas, muitas das vezes comprando acções dos mesmos bancos que os financiaram.

A queda das bolsas fez com que as acções tenham descido para valores percentuais em muitos casos de apenas um dígito em relação aquilo que eram no momento da compra.

Agora, pendurados nesses empréstimos concedidos, os bancos não vêem grandes hipóteses de vire a recuperar o dinheiro que emprestaram. Contudo, ao longo dos últimos anos esgotaram-se em prémios e salários milionários na expectativa de virem a capitalizar os juros de tais financiamentos.

Quando se consome o que se tem com base na expectativa do que se há-de vir a ter no futuro, mas que é incerto, corre-se o risco de se acabar mal.

Apesar das enormes injecções de capital nos mercados financeiros que os governos de muitos países fizeram, o “buraco” da gestão danosa das últimas décadas é quase inquantificável, o que leva a que a suspeita de que a saúde do sector financeiro é ainda muito débil seja uma realidade. Existe mesmo a possibilidade de que grandes derrocadas possam ainda acontecer, incluindo bancos de grandes dimensões, impensáveis de estarem sujeitos a tais ameaças.

Quando alguém me pergunta qual o banco mais seguro, por graça costumo referir que é o “colchão”. Mas a verdade não anda longe se dissermos que depositar as poupanças em contas mesmo a prazo, com capital e juros garantidos por contrato, em qualquer banco comercial, é tão arriscado como emprestá-lo ao “vizinho” que não conhecemos de lado nenhum.

Se a economia não recuperar, por via da produtividade e do necessário consumo, e se forem criadas pressões externas sobre a economia, como o aumento do preço da energia, o sector financeiro poderá vir a sofrer pressões que potencialmente serão danosas para o sector financeiro, não se sabendo até onde poderá este aguentar tais vicissitudes.

O risco em ter dinheiro nas mãos de outrem nunca foi tão grande como agora.

sábado, 12 de setembro de 2009

O MELHOR NEGÓCIO DO MUNDO

Quando se produz algo a partir de quase nada.

Em qualquer negócio que produza um produto ou serviço, teremos sempre de considerar a existência de entradas (inputs) e de um qualquer processo que transforme as entradas em saídas (outputs). Assim, quem quiser transformar sementes em produtos agrícolas, terá de tratar a terra, semear as sementes, adubar, regar, curar e colher o produto final. A este processo de transformar sementes em produtos agrícolas, que serão vendidos por um montante superior à soma do custo das sementes e do custo da mão de obra e dos outros produtos utilizados, chama-se “criação de valor”. O mesmo se passa em qualquer indústria transformadora onde se utiliza matéria-prima, acessórios, produtos de consumo e mão de obra, bem como em qualquer serviço onde se utiliza conhecimento, mão de obra e produtos de consumo.

No sector financeiro é suposto que a principal “matéria prima” utilizada seja o dinheiro, em notas e moedas. Seria suposto que os bancos angariassem a sua “matéria prima” principal, o dinheiro, através da cativação de depósitos em moeda feitos por clientes, a quem pagariam uma determinada “renda” (juro) pela utilização do dinheiro e o utilizassem para emprestar a outros clientes por uma “renda” (juro) maior, fazendo da diferença do juros pagos e dos juros recebidos o seu lucro grosso. Naturalmente que a este meio de criar “valor acrescentado” há que adicionar os proveitos que advém da cobrança de custos dos serviços prestados, como emissão de cartões e manutenção de contas.

De facto, não acontece assim tão literalmente. Principalmente no que se refere à utilização da matéria prima utilizada, o dinheiro. Por cada euro depositado os bancos emprestam muitas vezes mais euros, chegando a onze vezes e meia no caso do mercado nacional.

Em nenhuma indústria se consegue multiplicar as entradas (inputs) de forma tão miraculosa. De uma dada quantidade de matéria prima não se consegue retirar mais do que aquela que existe. No caso da indústria financeira, o milagre da multiplicação é uma realidade. Por isso, os bancos poderiam até emprestar dinheiro a juros mais baixos do que aqueles que pagam aos depositantes que conseguiriam ainda produzir lucros.

A utilização abusiva deste mecanismo de criação virtual de dinheiro levou a muitos exageros, em que muitos participantes e no processo foram beneficiados com prémios e salários exorbitantes retirados de onde não existe “nada”. Com a crise criada nos EUA pelo sub-prime, e pelas implicações do mesmo nas bolsas de todo o mundo, os bancos viram-se de repente sem a possibilidade de recuperar o dinheiro virtual que tinham injectado na economia, sob o qual tinham assumido compromissos, mas para os quais já não possuíam reservas suficientes para honrar esses mesmos compromissos.

A injecção de capital que os governos fizeram nos mercados financeiros foi para tapar esses buracos que ameaçavam os bancos de ruptura de “stock” de capitais para cumprir com os seus compromissos perante os clientes depositantes.

Como pode então um negócio que produz “outputs” sem utilizar “inputs” vir a ter problemas? A resposta é simples: retira-se do negócio mais do que aquilo que ele produz.

A aparente facilidade com que se criava, e ainda se cria, dinheiro vindo do nada fez com que alguns intervenientes pensassem que o processo não tinha limites.

A regulação e a fiscalização deverão ser revistas para que abusos como os que aconteceram durante as últimas décadas não possam acontecer no futuro com impactes nefastos na economia em geral e no bolso dos contribuintes em particular.

 

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

A BANCA E A SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL

A banca em geral, é por si própria e intrinsecamente, um conflito de interesses.

Os bancos, ao contrário de muitos negócios nos dias de hoje, tem forçosamente de ter uma visão de longo prazo. Compreende-se facilmente esta necessidade: se o cliente vai pagar durante os próximos vinte anos o financiamento que pediu emprestado para comprar a casa , será bom que tanto o cliente como o banco existam por mais, no mínimo, vinte anos.

Esta perspectiva de longo prazo de muitos dos negócios financeiros, a qual também serve para capitalizar resultados sustentáveis, deveria ter forçosamente algum impacte nas politicas negociais do sector financeiro, de forma lata.

Dizia-me um director de um banco que os clientes obrigam muitas vezes os bancos a inovarem. O poder do capital é enorme, como referia ele, tendo os bancos por vezes de criarem produtos específicos para necessidades específicas de alguns clientes, como por exemplo um fundo de uns milhões de euros para uma igreja e respectiva comunidade de fieis numa carteira de acções que não incluísse negócios como a produção e venda de armas e material de guerra ou a produção de cereais transgénicos.

A força dos muitos milhões de euros que se adivinhavam para entrar neste fundo de investimentos fez com que o banco juntasse uma carteira de acções em conformidade com os requisitos.

Compreende-se. O cliente justificava e a perspectiva de longo prazo do banco também.

A questão da sustentabilidade ambiental tem, contudo, criado um novo problema para os bancos.

Caso a ameaça do degelo dos pólos se venha a concretizar como resultado do efeito de estufa que a constante poluição da nossa atmosfera por indústrias, viaturas e outras fontes poluidoras está a provocar, sendo que esse evento pode provocar fortes transformações na geografia dos continentes, com enormes impactes na localização de populações, exploração de solos e, consequentemente, na politica e na economia, o negócio de longo prazo dos bancos corre sério risco de ser fortemente atingido.

Então, porque continuam os bancos a financiar negócios que poderão cavar a própria sepultara do sector bancário?

Será que os lucros de curto prazo se sobrepõem a todos os outros interesses de longo prazo?

Porque não utiliza o sector bancário o seu enorme poder de “lobby” para provocar mudanças nas políticas governamentais a nível global para que se eliminem as indústrias poluentes e outras fontes de destruição do ambiente?

Estas são questões que não parecem ter resposta, de forma imediata, mas que a médio prazo vão ter de ser respondidas ao público em geral.

A visão do lucro rápido e fácil criou a crise do sub-prime.

O que nos acontecerá se a visão meramente economicista de curto prazo continuar a prevalecer no sector financeiro numa situação de mudança climática global e grandes dimensões?

Nunca saberemos se da próxima vez a população mundial terá disposição e capacidade para pagar mais uma crise financeira que as mudanças climatéricas rápidas ou de médio prazo possam trazer ao mundo. O futuro o dirá!

sábado, 5 de setembro de 2009

AUMENTAR O CONSUMO INTERNO AJUDA A ECONOMIA? NEM SEMPRE!

O POTENCIAL ERRO DO AUMENTO DO CONSUMO INTERNO

Em época de eleições, ouvem-se muitas vozes a defender a teoria de que o aumento do consumo interno servirá para fazer crescer o PIB e melhorar a economia. Assim, vários políticos propõem que se baixem os impostos, directos e indirectos, que se aumentem os ordenados e os subsídios de reforma, desemprego e outros, tudo com o objectivo de deixar mais dinheiro nas mãos das pessoas de forma a que o possam despender na compra de bens de consumo e outros e, assim, fazer subir o PIB.

O primeiro, e grande, beneficiário do aumento do PIB é o Estado que vê aumentada, dessa forma, a base tributária em que faz incidir os mais diversos impostos. O aumento do PIB é sempre o bom negócio para o Estado.

Mas será que a subida do PIB com base no aumento do consumo é bom para a economia nacional? Não necessariamente.

Vejamos primeiro de onde vem o dinheiro que irá parar ao bolso das pessoas por via dos aumentos de salários, subsídios e outras formas?

Se a fonte desse dinheiro for de origem interna, quer isto dizer, da criação de valor interno por via da produção de produtos e serviços que são exportados ou substituem outros importados, então estaremos perante uma posição potencialmente favorável. Se a fonte do dinheiro for outra que não a interna, isto é, se for de origem externa por via do investimento e do financiamento, estaremos perante um potencial problema. O investimento externo tem sempre um carácter temporal limitado e mais tarde ou mais cedo será retirado, juntamente com os lucros obtidos, pelo que a fonte é temporária. O financiamento externo implica juros e a necessidade do devido pagamento, dentro de prazos determinados. Assim, a fonte do dinheiro é importante na medida que pode comprometer o futuro.

Depois, teremos de ver para onde vai o dinheiro. Se o consumo for de produtos ou serviços nacionais, produzidos principalmente com matérias primas e mão de obra interna, esse consumo estará a alimentar a criação de valor que será mantido na economia do país e poderá servir para fomentar o auto-crescimento desta.

Porém, se o dinheiro for utilizado no consumo de produtos e serviços adquiridos além fronteiras ou com uma forte componente externa, estaremos a fazer com que os recursos monetários existentes estejam a sair do circuito interno e, consequentemente, a perder-se para outros.

Assim, o consumo apenas deve ser fomentado ser for direccionado a produtos e serviços cujas matérias primas, componentes e mão de obra sejam maioritariamente internos, de forma a reter o capital dentro das fronteiras económicas nacionais. Fomentar o consumo de produtos e serviços importados é o mesmo que cavar a sepultura da própria economia, na medida em que se perdem recursos próprios ou, o que ainda é pior, emprestados que terão de ser pagos com juros, mais cedo ou mais tarde.

Desta forma, seria bem melhor se se fomentasse o desenvolvimento de condições favoráveis à criação de valor acrescentado interno à economia do pais, com base em matérias primas, conhecimento e mão de obra locais.

Dito isto, começa a ser fácil perceber onde deverão incidir as políticas de desenvolvimento da nossa economia. Exactamente nas matérias primas (transformação), conhecimento (I&D) e mão de obra (competências) nacionais. 

Se olharmos para a maioria do que compramos no dia-a-dia reparamos que quase nada é feito em Portugal. A comida, os combustíveis, o vestuário, as viaturas, as ferramentas, os medicamentos, os electrodomésticos, as matérias primas para a industria e construção, etc., etc. Ou será que esta evidência é “estupidamente” incompreensível.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

O INVESTIMENTO PÚBLICO E A ECONOMIA

MUITO INVESTIMENTO PÚBLICO TEM POTENCIALMENTE UM FRACO IMPACTE NA ECONOMIA.

Independentemente das diferentes opiniões que possam existir acerca do intervencionismo dos Estados na economia, o facto é que de alguma forma todos os Estados fazem investimento público que tem algum tipo de efeito na economia e na sociedade.

Desde posições extremas de intervencionismo como sugeridas por Karl Marx até às de nenhum intervencionismo defendidas por Milton Friedman, passando por posições intermédias como a de John M. Keynes, temos níveis de intervenção do Estado na economia para todos os gostos.

Os Estados intervêm nos mercados com o objectivo de eliminar aquilo a que se chama “falhas de mercado”. Estas são causada pelo desinteresse, principalmente económico, ou pela impossibilidade da sociedade civil criar uma determinada oferta. Por exemplo, a justiça dificilmente seria um negócio tão lucrativo que pudesse atrair investimento privado. A investigação e desenvolvimento em certas áreas do conhecimento também não é suficientemente lucrativa para que a sociedade civil surja com suficiente investimento para satisfazer as necessidades existentes no desenvolvimento do conhecimento.

Muitas infra-estruturas, de grandes dimensões e prazos alargados, só são possíveis se forem fortemente financiadas pelo Estado.  A segurança interna (pública) e externa (militar) e a justiça serão áreas com forte tendência manter a sua total dependência do financiamento dos Estados. A saúde e a educação poderão ter áreas que possam interessar ao investimento privado, pelos seus níveis de lucro ou pelas especificidades dos mercados. As restantes áreas, mesmo algumas como a da energia e das comunicações, conseguem ser suficientemente atractivas para cativar investimento da sociedade civil.

Assim, por desinteresse da sociedade civil (investimento privado) ou pela necessidade de avultados investimentos, o Estado terá sempre um papel, mais ou menos, intervencionista.

Contudo, esta questão assume novas dimensões quando os interesses políticos por detrás do Estado, ou de quem o controla, levam a que o mesmo Estado tenha um papel mais intervencionista em áreas cujos resultados são acima de tudo políticos, como o crescimento artificial da economia ou a redução artificial do desemprego.

Escudados por interesses meramente políticos, muitos governos utilizam a prerrogativa que lhes está subjacente e intervêm na economia em áreas e na frequência que pouco ou nada beneficia a sociedade ou a economia em geral.

Isto acontece quando o Estado investe em “obras” que não têm qualquer efeito multiplicador futuro, ou se o têm é marginal e dificilmente justificará o custo. São exemplo disso as frequentes obras dos municípios no embelezamento das povoações. Em vez de se investir na criação de infra-estruturas de desenvolvimento sustentado e melhorado dos tecidos urbanos, constroem-se dispendiosos centros de rotundas com funções mera e exageradamente decorativas.

O mesmo se passa a nível governamental mais elevado. Distribuem-se computadores pelos jovens na escola mas não existem infra-estruturas de suporte para uma comunicação eficaz de internet nem professores preparados para tirar partido da nova ferramenta, não se retirando todos os potenciais benefícios que a distribuição de portáteis poderia trazer ao alunos.

Ao fazer este tipo de investimento, o Estado está apenas a criar oportunidades de negócio de curta duração para a sociedade. Terminados os mesmos, a sociedade civil voltará novamente à condição de necessitada de ajuda do mesmo Estado.

Porém, ao investir na aquisição e criação de novos conhecimentos ou na criação de infra-estruturas que possam facilitar o desenvolvimento da iniciativa privada por via de novos negócios, existirá naturalmente uma maior e melhor perpetuação da criação de valor pela sociedade. A criação de uma universidade numa cidade de interior pode levar ao desenvolvimento de negócios à sua volta, como resultado da existência de novas competências. A construção de um estádio de futebol na mesma cidade tenderá a não ser capaz de criar suficiente valor no futuro que justifique o investimento inicial.

Assim, muitas intervenções do Estado na economia têm apenas um impacte imediato e de curta duração, muitas vezes de mero carácter eleitoralista, e que não trazem qualquer benefício a longo prazo, nem para a economia da qual o Estado iria beneficiar nem para a sociedade que vê os seus recursos serem desperdiçados para satisfação de uns poucos.

Como cidadãos temos de compreender que nem sempre os investimentos do Estado têm o mesmo impacte na sociedade e na economia, sendo muitos deles estupidamente desnecessários e injustificáveis.

A SAÚDE OU FALTA DELA E A ECONOMIA

A SAÚDE E A ECONOMIA – diferenças e semelhanças entre a gripe A e o tabagismo.

O mundo está num total desespero com a gripe A (ou H1N1, ou suína).

Os governos em geral, especialmente os que têm capacidade económica e financeira para isso, encomendam vacinas aos milhões.

De repente, os quadros de pessoal médico e de apoio foi reforçado para efeitos de contenção da pandemia, por via da mobilização de quadros fora do activo ou do uso de horas extraordinárias.

Os medicamentos para curar, supostamente, a gripe são fabricados e vendidos em barda, enchendo as farmácias privadas e hospitalares.

As instalações e os equipamentos médicos e de suporte de vida são reforçados em grandes quantidades, para suportar o potencial crescimento no números de utentes.

A comunicação com o público para avisar dos sintomas, medidas a tomar e efeitos da gripe é feita por nos media (imprensa, rádios e televisões), na internet, por SMS,  e em panfletos distribuídos por vários meios.

As medidas de prevenção, descritas em enormes cartazes e produtos higiénicos de prevenção, são distribuídos por tudo o que é lugar público e privado com frequência do grande público.

Até agora, todas esta medidas implicam um enorme esforço financeiro da sociedade em geral mas, principalmente, dos Estados em particular. O dinheiro para suportar todas estas medidas corre a jorro para as mãos dos fabricantes e distribuidores de produtos e equipamentos que estão muito longe de se poderem considerar commodities, ou seja, de custo democratizado. Antes pelo contrario, a sua maioria são verdadeiros Premium, de custo elevados para quem os quer adquirir e de margens enormes para quem os fabrica e transacciona. Pelo caminho, empresas que desenvolvem actividade de comunicação e distribuição da informação também ganham a sua quota parte na “desgraça geral”.

Tudo isto para se chegarmos, até à data, à conclusão de que temos umas centenas de milhar de infectados em todo o mundo (quase três mil em Portugal) e menos de duas mil mortes causadas pela doença em todo o mundo (felizmente, ainda zero em Portugal). Preocupante? Naturalmente! O quer que seja que implique a perda de vidas humanas justifica plenamente qualquer esforço da sociedade. Contudo, o movimento criado para conter a doença ou para a eliminar, sem grandes resultados do ponto de vista dos números, criou um grande negócio à volta da nova gripe.

 

Mudemos de assunto e falemos do tabagismo. Comecemos pelos números: em muitos países a percentagem de fumadores ultrapassa os trinta porcento; o número de mortes directamente causadas pelo tabaco, e não indirectamente como na maioria dos casos da gripe A,  é de cinco milhões e quatrocentos mil por ano em todo o mundo. Sim, morre em todo o mundo e por ano o equivalente a metade da população portuguesa. Adicionando os enormes danos causados na população e na economia por doenças derivadas do tabagismo, estaremos a falar de vastos prejuízos para a sociedade, não só a nível económico mas também social. Contudo, o esforço feito para salvar vidas das garras infernais do tabaco parece ser mero divertimento quando comparado com o que é feito para a Gripe A. O Esforço feito para dissuadir as populações de fumarem é nulo ou insignificante e sempre inferior ao que é feito no incentivo ao tabagismo pelas tabaqueiras. A procura de soluções alternativas ao vício criado pelo tabaco são infrutíferas na sua maioria e apenas tentam explorar um nicho de mercado que pretende dominar o vício, ainda que com muito pouca convicção.

O consumo de tabaco, para além dos circuitos produtivo e comercial inerentes ao mesmo, é também um forte factor económico para os Estados por via de impostos de elevada percentagem. Algumas estatísticas apresentam números que pretendem demonstrar que existem casos em que as receitas do Estado são inferiores aos custos suportados pelo mesmo Estado e pela restante sociedade no tratamento de doenças causadas pelo tabaco e na recuperação das perdas de vidas e de capacidades e competências que advêm do consumo do tabaco. Contudo, e apesar dos elevados impostos, o consumo mundial de tabaco continua a aumentar e os circuitos produtivos e comerciais a verem crescer os seus lucros. O tabaco e as doenças que o mesmo provoca parecem ser também um grande negócio.

 

Assim, da comparação entre os critérios utilizados pelos Estados e sociedade no combate à gripe A e à mortalidade causada pelo tabaco podemos dizer que no primeiro caso se consomem tremendos recursos para evitar contágios e preservar vidas humanas e no segundo caso se guardam os recursos para mitigar os efeitos do tabaco quando já pouco há a fazer, permitindo contudo que todos os dias sejam infectados centenas de milhar ou mesmo milhões de jovens pelo tabagismo.

Para justificar os gastos no controlo da Gripe A, a prevenção é a palavra chave. Porém, o mesmo princípio não é utilizado para prevenir o vício do tabaco.

A grande diferença é que o tabaco, em todo o seu circuito de produção, distribuição e mitigação, deixa lucro a muitos agentes, pelo que a sua perpetuação é garantia de lucros continuados e a gripe A só poderá distribuir lucros se se utilizar a fase da prevenção para gerar negócio, porque depois da população humana criar defesas para a mesma desaparece a oportunidade.

O facto é que qualquer morte provocada pela gripe A é merecedora da maior publicidade e divulgação por todos os órgãos de comunicação, em todo o mundo. Mas a perda de cerca de quinze mil vidas por dia causadas pelo tabaco não merece a menor preocupação de ninguém, nem da sociedade, nem dos órgãos de comunicação, nem dos Estados.

Mais uma vez, a economia estupidamente dita os comportamentos da sociedade.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

A SEGURANÇA E A ECONOMIA

A quem convém a insegurança?

A questão da segurança, de forma geral, é um dos temas da actualidade.

Tanto a nível laboral como a nível social, o tema desperta paixões e discussões acesas. Vejamos alguns dos aspectos específicos da segurança e como eles interferem na economia, como a segurança nos locais de trabalho, a segurança para os utilizadores de produtos ou serviços e a segurança pública.

 

Comecemos pela segurança no trabalho. Sabemos que condições de trabalho adequadas evitam acidentes, os quais têm um enorme custo para a economia. Primeiro, e infelizmente, muitas vezes pela perda de vidas, que para além do tremendo impacte social que a perda de vidas humanas possa ter, temos ainda que em termos económicos a perda de vida corresponde muitas vezes à perda de competências e capacidade produtiva difíceis de repor. Depois, e nos casos de acidentes de trabalho menos graves, o absentismo causado pelas falhas de segurança é a causa de uma enorme percentagem de perda de produtividade, sendo algumas indústrias, como a construção, péssimos exemplos. Os custos para a sociedade são enormes, tanto com a perda de capacidade produtiva como com o restabelecimento das condições e aptidões das pessoas para o trabalho.

Desta forma, a legislação criado pelos Estados pretende eliminar as fontes ou causas  dos acidentes de trabalho. Porém, existem casos em que os requisitos impostos às empresas para cumprimento da legislação sobre segurança no trabalho são tão exigentes que asfixiam as empresas em termos da sua própria produtividade e rentabilidade. O problema para as empresas que têm de despender dinheiro para garantir a segurança no trabalho dos seus trabalhadores é que os seus clientes não valorizam esses custo. O problema para nós consumidores é que não queremos pagar os custos adicionais com algo que não acrescenta valor ao que compramos. A pressão sobre o preço que os mercados colocam nos produtos e nos seus fabricantes é tão grande que muitas vezes estes últimos se vêem obrigados a prescindir ou evitar as questões da segurança no trabalho, deslocando os seus centros de produção para regiões ou países em que a legislação é mais branda ou mesmo inexistente. Assim, podemos acabar por prejudicar potencialmente a economia de um país com legislação sobre segurança muito apertada. Por outro lado, a não existência de regras que contribuam para a mitigação dos efeitos nefastos da insegurança no trabalho também trás enormes prejuízos para a sociedade em geral.

 

O segundo aspecto da segurança está relacionado com a segurança dos utilizadores. O prejuízo ou danos que um produto ou serviço possa causar aos utilizadores é uma das maiores preocupações dos fabricantes, e também dos Estados. Os primeiros temem as consequências que culpas imputáveis aos seus produtos ou serviços possam trazer, geralmente traduzidas em enormes custos em indemnizações por danos causados e na perda da confiança do mercado. Os Estados tentam evitar os custos sociais que tais falhas de segurança possam trazer para a sociedade, mas também defender os interesses dos seus constituintes e aumentar os graus de confiança e de fiabilidade nos seus produtos de forma a facilitar a sua venda interna e externa.

A legislação criada para o efeito pelos diferentes Estados pretende, assim, eliminar situações de potenciais acidentes relacionados com a segurança dos utilizadores, aplicando-a a produtos (como por exemplo a marcação CE) e a serviços (como por exemplo a higiene e segurança alimentar).

O cumprimento das legislações trás sempre um aumento dos custos de produção para os fabricantes de produtos (como os airbags nas viaturas) e nos serviços (os requisitos higiénicos nos restaurantes).

Se nalguns casos os utilizadores beneficiam automaticamente com as questões de segurança em produtos e serviços, como no caso dos dois exemplos anteriores, noutras situações o valor que os utilizadores percepcionam não sofre alteração.

A mudança abrupta de legislação serve muitas vezes para criar barreiras à entrada de produtos externos ou para eliminar concorrência, criando assim protecções a determinadas indústrias, sendo que existe em muita da legislação existente nos mais diversos Estados objectivos que são claramente de carácter económico.

 

Finalmente, a segurança pública têm vários aspectos intrínsecos que podem ser analisados sob o ponto de vista económico. Para os cidadãos a segurança é um dos aspectos vitais, por razões obvias. A falta de segurança força as pessoas e restringirem as suas actividades a ambientes seguros, como as suas saídas a restaurantes, o que afecta economicamente quem consome  e quem vende. Mas, ainda ao nível das populações, a insegurança pode forçar a consumos ou gastos que não acrescentam valor para o utilizador. O alarme em casa ou no automóvel não trás nenhum conforto ou benefício extra, a não ser a possibilidade de evitar a possibilidade de roubo. Mas, não fosse a insegurança existente, isto é, a possibilidade de alguém cometer um crime contra os bens pessoais de alguém, ninguém necessitaria de despender dinheiro em equipamentos anti-roubo. Contudo, o facto de que existem pessoas dispostas a adquirir equipamentos de segurança anti-roubo cria imediatamente um mercado que é rapidamente satisfeito por fabricantes e fornecedores dos tais equipamentos.

Desta forma, temos que uma percentagem da população acaba por perder parte da sua riqueza para benefício de outros (o mercado) porque existem condições de insegurança pública que obrigam a tal, porque a relação entre o custos do investimento em equipamentos de segurança anti-roubo e valor do que poderia potencialmente ser roubado ainda lhes é favorável, para além das questões emocionais, também elas com potencias impactes económicos.

Esta situação agrava-se quando se trata de segurança pessoal. Como a protecção das pessoas é mais difícil de se conseguir do que as dos bens, tanto pelo risco inerente como pelo custo dos meios a utilizar, a segurança das pessoas é a que mais impactes causa na economia. A insegurança de se sair à rua reduz o consumo. Para evitar essa redução no consumo das populações, criam-se bolsas seguras onde a insegurança é eliminada, como zonas públicas altamente policiadas ou protegidas por segurança privada. Contudo, este tipo de acção trás custos adicionais à sociedade ou a quem explora um negócio e paga para ter segurança privada para proteger os seus clientes. Mais uma vez, o valor acrescentado para o consumidor, a não ser o da própria segurança pessoal, é nulo. Contudo, a necessidade de segurança das pessoas cria um mercado de serviços que, potencialmente, é lucrativo sem acrescentar valor à sociedade, que não o inerente apenas à segurança pública.

 

A segurança, nos seus diferentes aspectos, parece ser um bom negócio para muita gente. Mas, a que custo para a sociedade em geral ou para muitos indivíduos em particular?

Utilizam-se recursos que poderiam ser utilizados noutras áreas como a saúde e a educação, não fosse a exploração generalizada do medo que o ser humano possui e da falta de respeito pela vida, integridade física e bens dos outros. Economicamente parece fazer muito mais sentido se investíssemos, colectiva e individualmente, na educação dos princípios de cidadania a toda a população e na criação de condições de vida que eliminassem a necessidade de obter bens por outros meios que não os “societalmente” aceites como certos, neste caso, o trabalho.

A segurança é ainda também um tema “estupidamente económico”! E a quem convirá mais?

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

TGV ou AEROPORTO?

DIFERENÇAS ECONÓMICAS ENTRE TGV E NOVO AEROPORTO DE LISBOA.

 

No actual panorama politico, pré-eleitoral, os temas do TGV e do Novo Aeroporto de Lisboa têm sido trazidos à baile com uma certa frequência.

Sem qualquer interesse partidário, mas apenas dentro do campo da compreensão e explicação simplificada das diferenças entre um investimento e o outro, independentemente de quem o venha a fazer ou a suportar, convém compreender alguns efeitos que qualquer um deles possa ter a curto, médio e longo prazo.

O TGV é um projecto, em termos de construção e a curto prazo, que irá necessitar de uma infra-estrutura local (a linha férrea) e de equipamentos móveis (os comboios). A linha irá ser composta essencialmente por aterros, pontes, carris, catenárias, e estações. Para além da mão de obra local utilizada na sua construção, apesar de muita dela poder ter origem fora do nosso território, e de alguns materiais de construção de origem nacional, como os inertes e o cimento e pouco mais, a esmagadora maioria das matérias primas e outros bens que serão consumidos, como o ferro dos carris e para a construção, os cabos eléctricos e equipamentos electrónicos de gestão e controlo da linha, serão todos de origem externa. Os comboios serão na sua maioria produzidos com matérias primas e mão de obra externa, devido à nossa incapacidade de produzir os mesmos dentro do nosso tecido industrial.

A médio e longo prazo, o TGV irá sofrer o impacte do volume de utilização e dos custos de exploração. Nos custos de exploração podem-se incluir a mão de obra inerente à gestão e operacionalização da actividade, como pessoal técnico e de apoio directo à actividade e a manutenção dos equipamentos fixos e móveis. Para além dos condutores, controladores e pessoal de apoio, muito pouco mais haverá para referir, até porque a tendência é que a robotização das operações diminua a utilização de mão de obra humana. Quanto à manutenção de toda a rede do TGV é ainda uma incógnita e tanto poderá ser objecto de produção interna como externa, o que não permite mais do que esta simples menção. No que diz respeito ao volume de utilização do TGV é sabido que as previsões actuais apontam para níveis muito abaixo do breakeven de exploração, o que irá necessitar de uma forte componente subsidiário do Estado.

Assim, em termos económicos, e “à primeira vista”, o TGV não se vislumbra como o melhor dos investimentos. Primeiro porque irá necessitar acima de tudo da importação de bens e serviços externos, o que força a saída de divisas. Depois, porque no campo da exploração, o negocio se apresenta à partida como deficitário, necessitando de subsídios à própria exploração.

Vejamos o caso do Novo Aeroporto de Lisboa. Da mesma forma que no TGV, terá uma componente de projecto de construção a curto prazo e uma de exploração a médio e longo prazo.

No que diz respeito ao projecto de construção, o Novo Aeroporto de Lisboa irá ter uma componente de construção de infra-estruturas muito maior do que o TGV. O volume de construção pesada e ligeira poderá ser, se para isso forem competitivos, para empresas nacionais que utilizarão mão de obra local e materiais nacionais e externos. Contudo, tanto o volume absoluto como a percentagem de incorporação da componente nacional é muito maior do que no caso do TGV. Mais, devido ao seu carácter construtivo, tanto na quantidade de elementos físicos como na sua própria diversificação técnica (pistas, infra-estruturas rodoviárias, edifícios, equipamentos, etc.), a construção do aeroporto permitirá a divisão do trabalho por muitas e diferentes empresas, tanto em dimensão como em especialidade.

A médio e longo prazo, a grande componente é a utilização de mão de obra na gestão, controlo e execução das tarefas inerentes à própria actividade aeroportuária, como deslocação de pessoas e bagagens e abastecimento de aeronaves. Mais, actividades como a manutenção das próprias aeronaves podem ainda ser atraídas para o próprio aeroporto. A qualidade dos serviços e a sua disponibilidade e oportunidade podem contribuir para elevados níveis de volumes de utilização, o que poderá mais facilmente contribuir para a auto-suficiência económica do projecto.

Claramente, o NAL é à primeira vista e em termos económicos um investimento muito mais atraente do que o TGV. Primeiro porque emprega mais mão de obra nacional, bem como utiliza mais materiais e tecnologias nacionais. Depois, porque pode ser auto-suficiente na sua exploração, não carecendo de subsidiação do erário público.

A escolha de um ou outro investimento está, ou deveria estar, acima de tudo relacionada com os impactes económicos. Afinal, também neste caso, “é a economia, estúpido!” 

O PORQUÊ DESTE BLOG!

É a economia, estúpido!

Os novos tempo exigem de todos nós, cidadão anónimos, que tenhamos a capacidade de compreender novos paradigmas e de influenciar os ambientes que nos rodeiam.

Geralmente tida como uma ciência “oculta” para a maioria da população, a economia é, acima de tudo, uma ciência cujos fundamentos se baseiam no senso comum e na lógica, apesar da sua dependência do comportamento humano que não prima nem por bom senso nem por qualquer possível lógica.

A ciência política, apesar de muitos evitarem tal epitáfio, é antes demais, a aplicação dos mais diversos princípios económicos, especialmente durante os últimos séculos, desde Adam Smith, passando por Karl Marx e John M. Keynes, até Milton Friedman, todos eles economistas e não políticos.

Estes novos tempos e as novas tecnologias de informação e comunicação permitem que muitos de nós tenhamos hoje acesso em minutos a mais informação do que os nossos antepassados recentes em muitos anos. A internet permite-nos aceder a conhecimento e a informação, em tempo real, como nunca foi possível. Assim, a economia começa a perder o seu carácter de ciência “oculta” e passa a ser estudada e apreendida por muitos cidadãos, independentemente do seu nível cultural, económico, académico e posição geográfica.

Dentro destes parâmetros, qualquer indivíduo pode ter hoje uma opinião mais clarificada e acertada em termos económicos. Assim, surgiu a ideia de criar este blog, sobre a economia vista de forma simples, cujo título foi inspirado numa expressão muito típica dos norte americanos (it’s de economy, stupid) e que pretende precisamente fazer descer os conceitos para um plano o mais básico possível que seja compreendido por qualquer individuo, mesmo que sem qualquer preparação ou educação nas ciências económicas.

Assim, irei, sempre que possível e conveniente, trazer a este fórum temas cuja explicação tenha algum carácter económico, ou que seja mesmo apenas explicável sob o ponto de vista das ciências económicas.

O contributo e os comentários são, porque nunca o poderiam deixar de ser, mais do que bem vindos, até porque se pretende que este espaço seja acima de tudo um espaço de discussão e de opinião.

Algumas vezes irei fazer referências cruzadas com outros blogs em que participo, até para evitar publicar repetidamente os mesmos conteúdos.

Obrigado pela atenção e participação.

Teles Fernandes  


Nota: a frase "it's the economy, stupid" foi amplamente utilizada pela campanha de Bill Clinton em 1992 contra George Bush. A pergunta que temos de fazer é: quantos seguidores de Bush temos nós  em Portugal?